Se tem uma coisa que a recente “PEC 6×1” tem feito é fomentar o debate sobre novas formas de trabalhar. Apesar do foco em acabar com a escala de seis dias, o projeto também apresenta uma sugestão de escala 4×3 para ser discutida pelo governo e pela sociedade, algo que engloba ainda mais setores em todo o país.

Cada área do mercado funciona de maneiras diferentes; enquanto o comércio atua comumente com uma só folga por semana, outras indústrias possuem escalas variadas, como o 12×36, em que se trabalha por doze horas e folga pelas próximas 36. A reavaliação desses modelos é importante, e de fato precisa acontecer de tempos em tempos, como a História nos mostra. A tecnologia avança e a humanidade também, o que significa mudanças no modo como vivemos.

Agora, na prática, há muito a considerar para que esse tipo de transformação realmente aconteça. Pensando especificamente na área de contabilidade, há uma série de desafios a serem enfrentados para que um possível formato 4×3 seja implementado.

Em primeiro lugar, precisamos falar da demanda. Com o alto nível de compliance exigido pela legislação brasileira, o fato é que contadores já fazem hora extra com frequência atualmente. São inúmeras minúcias, checagens, revisões e atualizações constantes nas leis. Mesmo com a Reforma Tributária se aproximando, ainda possuímos um dos sistemas fiscais mais complexos do mundo, e me parece improvável que seja possível dar conta do trabalho com um dia a menos na semana.

Daí, sobram duas opções: investir em tecnologias de ponta para agilizar os processos e dar um respiro para os profissionais, ou contratar outras pessoas para ocupar o gap deixado pela nova folga. Nos dois casos, há um aumento de custos, o que nem todo escritório será capaz de cobrir. Os que puderem, naturalmente terão que aumentar os valores cobrados, o que impacta o mercado como um todo e cria uma onda de aumento de preços em todos os setores, já que a contabilidade é essencial para todo tipo de negócio.

Mesmo a contratação de novos talentos traz um desafio próprio, pois há uma falta evidente de profissionais capacitados na nossa área. Até mesmo iniciativas sociais têm sido criadas pelo país para estimular mais jovens a entrarem para a carreira contábil, porque a situação é de fato preocupante. Portanto, mesmo considerando que o escritório consiga pagar por novos funcionários, encontrá-los não é necessariamente uma tarefa fácil.

É por isso que qualquer alteração significativa no modelo de trabalho atual precisa ocorrer a partir de muita conversa com todos os setores da sociedade. Com os acordos e compromissos certos, que englobem o impacto econômico e social igualmente, a proposta pode ser desenvolvida. Caso contrário, será difícil atravessar até mesmo os primeiros obstáculos — e a contabilidade certamente não pode ser deixada para depois.

Max Gabriel é sócio-proprietário da Sima Contábil, empresa associada da Associação Brasileira de Provedores de Serviço de Apoio Administrativo (Abrapsa)